sexta-feira, 5 de setembro de 2008

Perguntas, respostas e silêncios

São milhares de perguntas que não foram feitas, que não foram respondidas, que não foram pensadas. Precisamos, entretanto, acostumar-nos com o silêncio de algumas situações em que somos levados a crer que não é possível obter qualquer resposta... Isto sim é angustiante. Mas... o que importa é que podemos perguntar, mesmo sem resposta, pensar, mesmo sem pergunta, inquirir, mesmo sem interlocutor? Não! Isto não é possível. Precisamos, no mínimo, de um interlocutor. Ah, mas às vezes somos nosso próprio interlocutor. Sim! Somos, talvez na maioria das vezes, mas esta é uma questão inferior. Sim, inferior porque exatamente agora eu sou o meu interlocutor, apenas eu me ouço, sem entender-me supostamente! Quem poderia dar a resposta para pergunta que não conseguimos responder para nós mesmos? Deus? Improvável! O que buscamos vai além de Deus? Por que? Porque nós somos deuses, toda as verdades se encontram no cerne do nosso ser, como diria Beauvoir. E nesse cerne está o nada, o silêncio, o vácuo. Mas se tem o vácuo aí, então, não se trata do nada. Onde há o vácuo não há nada! Estranho! Sim, estranhíssimo! Não sei muito bem o que os filósofos têm pensado sobre o nada, não li muita coisa, mas penso que é uma questão capital para a Filosofia. Nada nos ampara, nada funciona, nada dá certo, nada, nada, nada. Então preenchemos o nosso ser com tudo o que o mundo pode nos oferecer: drogas, religião, que é a mesma coisa, sexo, cultura, linguagem, relações. Nos relacionamos com tudo o que nos cerca, extrapolamos os nossos limites através das perguntas sem resposta. Extrapolamos através dos vazios da alma, dos vazios do mundo. A nossa alma? Onde está ela? No cérebro? Talvez, porque no coração é que não está. Quer dizer, não sei, a alma me remete a movimento. A alma de qualquer coisa, parece-me, é o movimento que faz qualquer coisa. Ufa, depois de descobrir que existem elétrons à volta do núcleo dos átomos que se movimentam constantemente, ciclicamente, irresolutamente, descobri que a saída é o movimento. Precisamos movimentar-nos. Na verdade, se consideramos que os átomos sem fim do nosso corpo não param de se movimentar em nenhum lapso de milésimo de segundo, compreendemos que também não paramos. Podemos ao menos tirar uma lição da experiência que parece nos estacionar, que parece embargar nossas vozes...
É como se fosse um grande vão. A frincha da porta, por onde entravam, nos tempos de menino, as assombrações que nossas mães nos ensinaram a temer. A sombra da roupa no varal sempre me assustou. Hoje digo à minha sobrinha não há nada, é só a roupa agitada pelo vento, é um pombo, um cachorro, um gato no telhado. Antes não dormia porque todos os ruídos me atrapalhavam. Hoje não durmo porque o silêncio ensurdece à noite e emudece ao dia. Não tenho mais os ruídos, mas, sim, os silêncios, os vazios, as mentiras. Grito e espero o eco que não reverbera além da minha cabeça, pergunto você ouviu isto? Mas do vão só vem a mentira, a esperança de fuga, de escape. Mas se atravesso, espremido, o espaço entre a porta e o chão, percebo o inferno do vazio que comprime para uma diminuição eterna até que se chegue à fração de nada. O sol está todas as manhãs lá, às vezes mais ao norte, às vezes mais ao sul, às vezes entre nuvens ou entre brumas, mas está lá. Ilumina. Brilha, gira, roda, reflete. Ai se ele não o fizesse, ai se ele não nascesse inexoravelmente. Acostumar-nos-íamos às trevas? Pensava que o silêncio estivesse relacionado às trevas, mas descobri que não. O sol nasce silencioso. A Lua brilha silenciosa. O silêncio talvez esteja relacionado ao estático, ao não-movimento. Tudo grita para que se mexa. Borges disse que alguém disse que uma pedra quer continuar sendo uma pedra, como um tigre quer continuar sendo um tigre, como o homem quer continuar sendo um homem. Em que nos transformaremos além de pó, e de flores ou estrume? Memória indesejável porque provoca dor? Saudade? Não nos tornaremos nada, nem posso dizer que nos tornaremos nada, porque a grande aporia do nada para mim é que como é possível que nada seja nada sendo alguma coisa, então ele é o indefinível como este texto, nada como este texto no tempo que o apagará, lá onde não haverá o movimento nem dos meus olhos que o perscrutará à procura de uma resposta secreta, silenciosa, nas minhas palavras...